sábado, 13 de setembro de 2008

E a Economia da Cultura?

Quando ministro da Cultura no Governo de Sarney, Celso Furtado encomendou à Fundação João Pinheiro (MG) o primeiro grande estudo sobre a Economia da Cultura no País, concluído em 1987: A Indústria Cultural no Quadro da Economia Brasileira. Nos debates culturais de hoje, têm aflorado referências quanto à necessidade de aprofundar o conhecimento sobre “cadeias produtivas” na área da cultura.

Em Pernambuco, a questão da economia da cultura foi colocada em pauta em 1985, no processo de discussões culturais que culminou na movimentação geradora das eleições à Lista Tríplice para a escolha do presidente da Fundação de Cultura Cidade do Recife.Em palestra na então Galeria Metropolitana de Arte, no Recife, o economista Manuel Messias assinalava a tendência de os estados capitalistas reduzirem os investimentos em cultura, repassando parte dos encargos para a iniciativa privada.

Daquele tempo até agora, os órgãos ligados a planejamento econômico e urbano, como Fiam, Fidem e Condepe, em diversos governos, e independentemente de coloração política, continuaram abordando a economia e elaborando projetos de desenvolvimento, sem considerar o item cultura. Acompanhando a tendência dominante, o segmento dos economistas, dentro e fora da universidade, colocou a placa na porta: CULTURA NÃO ENTRA.

Em 1987, no Governo Arraes, com Tarcísio Pereira na presidência da Fundarpe e sob a coordenação do poeta-sociólogo Alberto da Cunha Melo, realizou-se em Caruaru a experiência-piloto do Projeto do Cadastro Cultural de Pernambuco.Entre mais de l.200 produtores culturais na cidade e nos sítios, foram coletadas informações sobre o peso da cultura na renda familiar de cada um. O cadastro pernambucano foi abandonado, a partir daí, por todos os governos. E continua relegado, mesmo possuindo o status de exigência legal inscrita em 1989 na Constituição Estadual de Pernambuco. Como disse o poeta Drummond, “As leis não bastam/Os lírios não nascem da lei”.

Na década de 90 do século passado foram concluídos o Censo Cultural do Ceará (1992), o Guia da Produção Cultural da Cidade do Rio de Janeiro (1993), o Guia Cultural da Bahia (1998). Os dados coletados prendiam-se a listagem de produtores culturais, calendário de eventos e indicação de espaços culturais disponíveis. Nenhuma informação de caráter econômico.No ano 2002 a Prefeitura do Recife lançou o seu Cadastro Cultural no mesmo estilo, identificando segmentos de produtores e sem considerar os aspectos econômicos. A experiência de 1987, em Caruaru, continuaria mantendo a distinção entre cadastro cultural e mala direta.

Em 1986, sendo Nailton Santos o superintendente da Sudene, foi criado o Grupo de Política Cultural do órgão, coordenado por Janice Japiassu. Realizaram-se dez encontros estaduais de cultura, com a participação de entidades representativas do poder público e da sociedade civil. O passo seguinte foi o I Encontro Nordestino de Política Cultural, em setembro de 1987, cujo documento final apontou uma série de itens relacionados à economia da cultura.

O GPC – Sudene foi extinto no Governo Collor. Com a ação devastadora de Ipojuca Pontes no Ministério da Cultura, a resistência e a sobrevivência passaram ao primeiro plano. Com Itamar e nos dois governos de Fernando Henrique Cardoso, a discussão econômica ficou centrada nas questões ligadas ao sistema de incentivo à cultura, a partir de deduções do Imposto de Renda. O resultado final foi a concentração dos recursos, em mais de 90%, numa restrita fatia de projetos situados na faixa Rio-São Paulo. Os estados e municípios seguiram o modelo federal – o modelo da corte portuguesa - fazendo leis de incentivo igualmente concentradoras de recursos, em benefício de produtores culturais situados na capital ou na área metropolitana, salvo raríssimas exceções.

Em 1993 a Unesco divulgou o seu relatório sobre a Cultura (Nossa Diversidade Criadora), criticando o lugar comum imperante, lançando o conceito de desenvolvimento cultural, pregando a reformulação das políticas culturais atuais, o desenho de “novos mapas”, e apresentando uma agenda de trabalho. Em 2001 a entidade realizou na Fundação Joaquim Nabuco um seminário que tratou da questão das informações e dos parâmetros relacionadas à cultura – o “IDH cultural”. No ano passado, o Centro Josué de Castro (PE), por falta de recursos, interrompeu no nascedouro o que poderia vir a ser, na área da música, a primeira pesquisa sobre economia da cultura em Pernambuco.

Na onda da nova Sudene, produtores culturais do Recife debateram e apresentaram propostas. No meu entender, trata-se de partir das definições do I Encontro Nordestino de Política Cultural de 1987 e incorporar as contribuições posteriores, sob a ótica do Relatório da Unesco, que, aliás, é largamente citado no Programa de Governo de Luiz Inácio Lula da Silva (A Imaginação a Serviço do Brasil).

Considerando toda essa “via crucis”, já é tempo de o poder público sair das generalidades em matéria de economia da cultura e passar aos objetos concretos de estudo, pesquisa, ação executiva, cumprimento de lei e de programa de governo, colocando o foco acima e além do âmbito restrito do sistema de incentivo fiscal.

* Publicado no Jornal do Commércio, Edição de

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