sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Josué de Castro: um gigante multifacético

Marcelo Mário de Melo

“A mim cabe falar de mim, da minha era”, disse o poeta russo Wladimir Maiacovski. Esta diretiva se aplica por inteiro a Josué de Castro, que viveu profundamente envolvido nas teias e nos dilemas do seu tempo, como intelectual e político. Ou intelectual-político. Que formulou questões nos mais diversos campos do conhecimento, sempre procurando lhes dar respostas, na teoria e na prática. Com estudos de laboratório e pesquisas de campo. Andando por mangues e sertões brasileiros e nos seus correspondentes em outras partes do mundo. Propondo novas políticas públicas e assumindo a sua execução. Criando e dirigindo centros de estudos. Escrevendo artigos, ensaios e livros, da ciência à literatura. Fazendo conferências em fóruns nacionais e internacionais. Ocupando a tribuna parlamentar, dando entrevistas e falando em comícios.

Sempre com o olho universal e pluridimensional, Josué de Castro pertence ao círculo dos intelectuais-inventores. Daqueles que, superando esquematismos e limitações de época e escola, ultrapassam fronteiras de conhecimento e lançam novos paradigmas teóricos, provocando também o alargamento e o aprofundamento nas abordagens políticas e instrumentais.

Em Josué de Castro, os horizontes do cientista são reforçados pela experiência do médico na sua clínica pioneira nos assuntos da nutrição. À condição de teórico soma-se a de professor, no exercício da cátedra. Ao pensador se agrega o artista, que traduz em prosa literária os impactos e as situações-limite da fome, tecendo dramas e tragédias que enovelam o cotidiano de personagens-símbolos. E há ainda o cine-maníaco, que procurou difundir nas telas o drama da fome e suas alternativas.

Sobre tudo isto se levanta o orador excepcional e poliglota. Que impressiona platéias em improvisos na França, na Itália ou nos Estados Unidos. E encanta em conferências especializadas sobre assuntos de nutrição. Que desencadeia aplausos em auditórios estudantis. E arranca ovações em gigantescos comícios eleitorais.

Há ainda o professor ambidestro, que numa sala de aula começa a escrever no quadro com a mão esquerda e, a meio caminho, troca o giz para a mão direita e prossegue. O mesmo que anota taquigraficamente perguntas de jornalistas e as responde com precisão. Ou aquele que em rodas de amigos relata com sabor cinematográfico as suas andanças pelo mundo.

Nesta introdução, a dificuldade de não poder desenhar um retrato 3x4, incompatível com a figura intelectual e política de Josué de Castro, um pernambucano universal e múltiplo que se dizia um “interessado no espetáculo do mundo” e esclarecia: “a minha medida é o homem. O resto é paisagem”.

Introdução a Josué de Castro Perfis Parlamentares 52 Plenarium - A editora da Câmara dos Deputados Brasília 2007

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