domingo, 21 de setembro de 2008

Proposta para Discussão

Marcelo Mário de Melo

Dois exclusivismos têm marcado a ação política da esquerda brasileira e impedido o engrossamento do caldo democrático-popular da oposição: o eleitoralismo e os atos de protesto calendarizados e vanguardistas contra as medidas consumadas das forças direitosas imperantes. Coisa que tem reduzido as entidades populares a produtoras de eventos, os partidos políticos a agências eleitorais e os militantes a desfilantes. Isto se complementando com a atitude de esperar que a aliança no poder se desagregue pelo resultado espontâneo das suas contradições internas, da ineficiência social do neoliberalismo e da corrupção cavalar. Sem falar nos que ainda pensam que o agravamento das condições de vida do povo poderá conduzir a um limite de saturação e fecundar um basta, esquecendo a advertência de Mário de Andrade: “miséria pare vassalo”.

Acima e além deste círculo fechado, é preciso avançar politicamente, com raízes, caules, folhas, flores e frutos. O que não é possível com a auto-estima do povo lá em baixo. E o que permite elevar a auto-estima das massas, no futebol e na política, é a capacidade de conquistar determinados objetivos imediatos que marquem pontos positivos. Está certo que se navegue em todas as contribuições pós-leninistas em matéria de estratégia e de tática. Mas é sumamente emburrecedor e infrutífero resvalar no pré-leninismo. E o velho Wladimir recomendava, se possível, uma vitória por dia, mesmo que pequena, para levantar o moral do povo, sendo função da vanguarda empenhar-se neste sentido. Enquanto os neoliberais propagam a competitividade individualista, o engole-engole de pobre contra médio e de pobre contra pobre, na disputa pelos ossos do banquete e em meio às ilusões virtuais e televisivas do marketing político, cabe à esquerda vicejante intensificar a mobilização das massas em torno de objetivos práticos e palpáveis, que melhorem a vida e elevem o astral. Politicamente, esta é a nossa razão de existir. E isto pode ser feito, paralelamente às articulações cupulosas, eleitorais e grupais, em que muita gente se especializou, se extremou e se deformou.

Afinal de contas, para que diabo serve uma vanguarda se não for para ajudar o povo a viver e conviver melhor? Vanguarda de si mesma não existe: é clube, seita ou quadrilha. E pode ser considerada substanciosa e conseqüente uma vanguarda tarada, que só pensa naquilo (as eleições) e se restringe a atos militantosos de protesto, ações de marketing e emoções cubiculares? Companheiros, um pouco de mobilização popular não faz mal a ninguém. Pelo contrário. Articular os barulhos do marketing com o movimento das massas é uma fórmula competitiva que pode render bons juros na bolsa dos valores políticos e sociais da população exaurida e tão compreensivelmente desencantada e desconfiada com a política e os políticos. Nós, que sentimos nas nossas fileiras as sombras do adesismo e as gosmas das disputas autofágicas, se rompermos com o círculo fechado do cupulismo, poderemos nos rejubilar ante o espetáculo da divisão dos nossos inimigos políticos e os saldos de vitória das grandes campanhas populares, que ajudam o povo a levantar a cabeça e melhorar a vida. Fora disso, é navegar nas águas insossas e pantanosas de uma ação política capenga, que promove personalidades e grupos, mas é incapaz de alimentar as conquistas coletivas, a organização popular e a autoconfiança das massas.

Sejamos precisos e práticos, descendo aos talhes dos detalhes, para lançar algumas campanhas nacionais de mobilização popular, ou uma só campanha cativante em torno de três ou quatro itens que respondam aos interesses de três grandes segmentos: os assalariados em geral, os pequenos e médios empresários, os subempregados e excluídos da cidade e do campo. Colaborando com os finalmente, proponho a campanha pela atualização imediata da tabela do imposto de renda, há sete anos congelada. Existe em tramitação um projeto de lei abrangente sobre o assunto. Mas a campanha deve se restringir à atualização da tabela, que pode ser feita por decisão administrativa. Há muito conhecimento acumulado sobre o assunto, sendo necessário, apenas, produzir material de agitação e programar as ações.Vamos listar as outras duas ou três questões.

Que os partidos políticos, sindicatos, associações populares, entidades estudantis, organizações não-governamentais, parlamentares, líderes, dirigentes, assessores e adjacentes, discutam esta proposta com o objetivo de que ela saia do papel para a vida, como dizia D. Hélder Câmara referindo-se à Constituição de 1988. Mãos à obra.

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