domingo, 21 de setembro de 2008

Lula: anseio do povo

Marcelo Mário de Melo

Em artigo publicado no Jornal do Commércio há cerca de dois anos, sob o título de “À Esquerda e em Frente”, fiz a defesa da quarta rodada com Lula nas eleições presidenciais de 2002. Na época, havia sido encampada pelo PPS, com dose elevada de carbureto, a candidatura de Ciro Gomes, já em vôo eleitoral autônomo. De lá até agora, muita água passou pela ponte. José Serra foi oficializado como candidato a presidente. Surgiu a candidatura de Antony Garotinho. O poder judiciário impôs a verticalização das alianças políticas. Foi detonada a candidatura de Roseana Sarney, levando à ruptura entre o PFL e o PSDB. E Lula passou a candidato preferencial do povo brasileiro, ultrapassando os 40% de preferência nas pesquisas e atraindo segmentos que se apresentavam resistentes.

Os dois elementos mais importantes na conjuntura política, evidentemente, foram a verticalização e a briga de família entre o PFL e o PSDB, que conseguiu ser mais atritada do que racha da esquerda. Ficaram na cabeça do povo brasileiro as imagens dos pacotes de dinheiro flagrados no escritório de Roseana e do marido Murad, com transmissão via satélite e ocupando as primeiras páginas dos jornais. Imagens que respingam na candidatura de Serra ou de qualquer outro candidato oficial, uma vez que, na consciência popular, a briga PSDB-PFL é traduzida como “briga de bandido”. Isto, associado à exaustão civil diante da dose dupla de Fernando Henrique Cardoso, favoreceu o crescimento da candidatura de Lula, alimentada, também, pela habilidade das suas intervenções e da sua propaganda televisiva.

Tem uma verticalização no meio do caminho, pedindo à esquerda que a decifre ou se devore. Não seria mais o caso de se exercitar o automatismo característico da realidade política anterior, com todos os partidos lançando, no primeiro turno, candidatos a governador e a presidente e conduzindo à parte as candidaturas proporcionais. Mas seria, mas foi, ao custo de uma drástica redução da representação de esquerda no parlamento, em todos os níveis, considerando-se os votos necessários para uma legenda eleger um deputado estadual e um federal. É só fazer as contas.

Os argumentos que sustentavam a candidatura de Ciro Gomes, emitidos pelo senador Roberto Freyre, eram de que Lula não conseguiria articular as forças de centro-esquerda, não ultrapassaria o patamar dos 30 % e, por isto, era o candidato desejado pela direita. Em síntese: uma verdadeira candidatura pé-na-cova. Mesmo há dois anos atrás, e admitindo-se a veracidade desse perfil cinzento de Lula, pintado pelos pinceis de Roberto Freyre, seria difícil admitir Ciro Gomes como alternativa. A não ser no terreno da ficção, num caso de hidroponia política. Ou nos embalos do puro marketing, afeito à fabricação de factóides. Carente de enraizamento democrático, e como não se tira sangue de tapioca, Ciro restou estacionado na linha do quebra-mar, onde se banham os garotinhos, com um olho ansioso catando apoios à direita e o outro vendo Lula avançar nas águas profundas.

A candidatura de Lula está aí como o sol, que não precisa de outdoor. Cresce no protesto, no investimento e na esperança dos pobres e excluídos do Brasil, da classe média estrangulada e, inclusive, dos segmentos empresariais menos banqueirosos e mais racionais, convencidos de que o programa econômico do PT não questiona o capitalismo e poderá ser melhor para todos. Apesar do pedigree de esquerda do PT - para o pudor de uns e o protesto de outros - trata-se de um autêntico programa de centro-esquerda, com muitos pontos de semelhança com o de Ciro Gomes. A diferença consiste menos na proposta esquemática e mais na credibilidade do candidato, sua história, suas raízes e bases de sustentação, que dão substância à esperança de um esforço real para cumprir com os compromissos.

Ora, mas se Lula apresenta um programa de centro-esquerda e ultrapassa os 40%, na preferência popular; se a direita está dividida e tem um candidato desatraente e estigmatizado; se a exigência da verticalização impõe mais unidade; se o povo brasileiro está exausto e ansioso por uma luz no fim do túnel; se Lula simboliza este anseio, o que está faltando para a unidade da esquerda, logo no primeiro turno destas eleições? Nos aspectos programáticos e táticos, o que poderá justificar a fuga dessa tarefa, principalmente, entre as forças políticas que já vinham apoiando Lula em primeiros turnos de eleições anteriores? E em tais circunstâncias, o que legitima as candidaturas de Ciro Gomes e Antony Garotinho?

Independentemente das maquinações partidárias, dos escritórios políticos e dos trique-triques dos caciques, o povo brasileiro já definiu, na base, a unidade em torno de Lula. A candidatura de Lula é o fato novo e requer a adesão das forças de esquerda e centro-esquerda, a exemplo do que fizeram em Pernambuco, em sintonia com o sentimento popular, figuras como Pelópidas Silveira, Fernando Lyra e Miguel Batista. É preciso engrossar cada vez mais esse caldo para uma vitória com Lula no primeiro turno, pois é neste momento que as forças da direita estarão mais divididas e fragilizadas, face às disputas nos estados em torno das candidaturas a governador, senador e deputados estadual e federal.

Ganhar no primeiro turno com Lula é o mote do momento. Vamos a ele.
Artigo divulgado pela internet











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